Museu Nacional da Idade Média

            Paris possui um número quase inacreditável de museus e locais destinados à preservação da história e da cultura francófona. Conhecer cada um destes lugares demandaria muito tempo e considerável investimento. Por isso é bastante aconselhável ao turista que eleja, dentre as inúmeras opções, aquelas que mais se identificam com o seu perfil e seus interesses pessoais.

            Aos aficionados por História e particularmente pela Idade Média, visitar o Musée National du Moyen Âge é, sem dúvida, uma obrigatoriedade. 

                  Localizado no centro do Quartier Latin, o próprio prédio onde se encontra o museu já é um aspecto de relevante motivação para a visita. O Hôtel de Cluny era a residência oficial do abade de Cluny (cuja sede se localizava em Saône-et-Loire) em Paris. Foi construído no Séc. XIII por ordem de Jean III de Bourbon e ampliado no final do século XV pelo abade Jacques d'Amboise. Ainda hoje podemos observar o brasão de armas de Amboise nas partes altas da fachado do prédio.

                A coleção referente ao medievo começou a ser formada em 1843 por Alexandre du Sommerard que alugou algumas peças do prédio a fim de reunir sua coleção particular referente ao período. Alguns anos mais tarde o Estado francês comprou a coleção e nomeou o filho de Sommerard, Edmond, como primeiro diretor do museu.

                 Hoje, o Museu da Idade Média de Paris é um dos mais completos do mundo dedicados a este conturbado período da História. Suas peças são de uma representatividade imensa e sua coleção abrange diversas áreas de expressão artística como a ourivesaria, pintura, escultura, vidraçaria e tapeçaria,  sendo esta um dos destaques do museu.

                     As armas utilizadas no período também estão em destaque, particularmente as espadas e armaduras, Sendo possível ao visitante empunhar uma réplica de uma espada com dimensões e pesos compatíveis com as utilizadas pelos combatentes cruzados.

               Objetos de ouro e prata são bastante comuns no museu, quase que na totalidade realizados com motivos religiosos, evidenciando o poder que a Igreja Católica exercia no período.

             A peça de ourivesaria de maior destaque é sem dúvida a Rose d'Or de Minucchio da Siena, realizada em 1330 pelo artista italiano e doada pelo Papa João XXII, o primeiro Papa de Avignon, a Rodolfo III de Nidau. Estas rosas de ouro eram confeccionadas pelos mais eficientes ourives da época, abençoadas pelo Papas e oferecidas a autoridades, igrejas, ordens ou cidades que manifestassem sua lealdade ao poder da Santa Igreja e ao Papa.

             As esculturas do museu também se destinam a enaltecer motivos religiosos, centrados na Sagrada Família e no próprio Cristo. A ideia que se procurava passar era da importância da família, o respeito aos ensinamentos religiosos, a importância do trabalho dedicado e servil e a adoração ao supremo sacrifício do Salvador que ofereceu sua vida pela remissão dos pecados do mundo. Os trabalhos se concentram em madeira, pedra e mármore e são importantes testemunhos de técnicas perdidas ao longo do tempo, em especial relacionadas à policromia dos objetos.

            

           Os vitrais também se destacam na coleção do museu, oferecendo um testemunho bastante detalhado da evolução desta arte num período de quatro séculos. Inicialmente destinados tão somente a oferecer iluminação ás igrejas por aberturas pequenas de estilo românico, os vitrais passaram a ser peças de extrema importância para a aproximação dos fiéis com o Divino, particularmente com a evolução da arquitetura e a passagem ao estilo gótico, com seus arcos ogivais e suas aberturas maiores pelas quais a luz do sol poderia incidir e, refletindo no vidro colorido, aumentar a ambiência de divindade que caracterizava as igrejas e encantava os fiéis. Uma das mais belas expressões dessa arte é a grande rosácea de catedral de Notre Dame de Paris.

         A pintura medieval conservada no museu também nos encanta pela qualidade de suas obras e poder de transmissão da ideia reinante no período. assim como as demais expressões artísticas, a pintura também se caracteriza por motivos religiosos. Seguindo as tradições romanas e que seguirão também pela Idade Moderna, após o Renascimento, era bastante comum na Idade Média as famílias de grande poder político e econômico escolherem artistas para retratarem imagens sacras ou do passado glorioso de seus ancestrais e assim demonstrarem sua importância social. Atuando como mecenas, estas famílias possibilitaram a chegada até nós de obras primas do período que demonstram ter sido a Idade Média não apenas uma era de obscurantismo e perda de capacidades intelectivas mas também um época de expressão artística de elevada qualidade, ainda que centrada majoritariamente em motivos bastante específicos.

              Mas algumas obras nos fornecem também indícios de que algumas ações ligadas ao estudo e à cultura não deixaram de ser contempladas, como evidencia a obra L'Arithmétique, onde se observa uma mulher ensinando a jovens da nobreza cálculos matemáticos com objetos concretos, uma técnica de ensino bastante comum na época.

    

            Mas não resta dúvida que os assuntos ligados à religiosidade eram mais comuns no período,como na obra "A Libertação de São Pedro", mandada executar pelo bispo Guillaume de Helande em 1460 em comemoração a sua elevação ao trono episcopal de Beauvais e o fim da Guerra dos Cem Anos. Caracterizam a obra, além da postura humanizada das personagens, evidenciada pelo apoio do santo sobre as costas do anjo, bem como pelo olhar fraternal deste para São Pedro, o brasão das armas do bispo, representando seu poder e a palavra PAIX, diversas vezes espalhada pela gravura, indicando a importância do fim de um conflito que se arrastava há 116 anos. 

             Ainda no tema religioso, se destaca entre as obras do museu o quadro da lenda de Saint Etienne (Sthephanos em Grego). O Santo teria sido um dos primeiros mártires cristãos, morto e lançado fora das muralhas para ser devorado pelas feras, teve, segundo a lenda, seu corpo guardado pelos animais que o mantiveram intacto até que fossem realizados os devidos ritos funerários. Saint Etienne foi um dos santos mais adorados na França durante a Idade Média.

             O grande destaque dentre as peças do museu, contudo, são as tapeçarias do medievo. Utilizadas nas paredes dos castelos e não espalhadas pelo chão como atualmente, as tapeçarias tinham a finalidade prática de manterem os locais aquecidos durante os rigorosos invernos e também expressarem as ideias vigentes na sociedade de então. A coleção mais completa preservada contudo, não retrata um motivo diretamente religioso...

      Com destaque para a obra La Dame a la licorne, a Dama e o Unicórnio em tradução livre, representa uma mulher nobre e a manifestação dos cinco sentidos na presença de um unicórnio e, por vezes de um leão e um macaco. Composta por seis tapeçarias diferentes, a coleção data do final do século XV e são interpretadas, de acordo com as atitudes da dama, como representantes do tato, da visão, audição, gosto e odor. A sexta tapeçaria, representando o sexto sentido, possui uma inscrição que pode ser traduzida "Meu único desejo", sendo interpretada como o Amor ou como a renúncia dos aspectos materiais e a entrada na vida devotada a valores espirituais.

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